Com juros altos e custo maior de dívidas, grupos correm atrás de injeção de recursos
Um grupo de empresas de capital aberto e fechado mais endividadas – que têm buscado aumento de capital e encontrado dificuldade diante do cenário de juros altos – tem avaliado novas alternativas para injeção de recursos para passar o período mais agudo do processo de reestruturação de seus negócios.
Com a alavancagem de muitas companhias voltando a crescer – e sem perspectivas de redução da taxa básica de juros, hoje a 14,75% -, uma injeção de capital tem sido a saída imediata, especialmente em um momento em que o mercado de capitais, por meio de oferta de ações, segue fechado para parte das empresas. Sem liquidez no mercado, uma parte tem recorrido a fundos de situações especiais (“special sits”) para conseguir ajustar o balanço em um momento de forte pressão no custo da dívida.
Empresas que recorreram à recuperação extrajudicial voltaram a renegociar prazos com credores e buscam aporte de capital para evitar o caminho da reestruturação judicial – caso da Azul, que entrou com pedido de “Chapter 11” na semana passada na Corte americana. A aérea, que concluiu, em abril, uma oferta de ações de R$ 1,66 bilhão, com conversão da dívida pelos detentores de papéis com vencimento em 2029 e 2030 e que passaram a ter 35% do capital da companhia, enfrentou dificuldades para levantar mais US$ 200 milhões para converter os 12,5% de dívida restantes. Na quarta-feira (28), entrou com pedido proteção aos credores (“Chapter 11”) nos Estados Unidos, com mais de R$ 30 bilhões em passivos.
A petroquímica Unigel tenta novo aporte, entre US$ 50 milhões a US$ 100 milhões, para evitar uma recuperação judicial, conforme antecipou o Valor, seis meses após a Justiça homologar seu plano de recuperação extrajudicial.
Outras empresas, sem conseguir também trazer um aumento de capital à mesa, têm convertido dívidas em ações ou em novas dívidas que poderão ser convertidas em ações. Isso tem ocorrido com a Casas Bahia, conforme seu plano de recuperação extrajudicial. Já a Infracommerce converteu cerca de R$ 732 milhões em dívidas bancárias em debêntures com vencimento em cinco anos, que poderão ser transformadas em ações da companhia.
As empresas mais alavancadas têm uma limitação de opção para ajustar seus balanços” — Luis Caldas
Entre parte das companhias de capital aberto, a atenção também está voltada para aumentos de capital com seus atuais acionistas, mas, segundo especialistas, a depender do sócio, a injeção não é a primeira opção, diz Joaquim Oliveira, da Seneca Evercore. “Hoje, um aumento de capital clássico é um risco maior do que no ano passado”, afirma o executivo. A alternativa, com a entrada de um private equity (que compra participações em empresas), também está descarta para o atual cenário.
Há grupos que estão recorrendo aos fundos especializados em prover capital para empresas em dificuldade, conhecidos como “special sits”, que estão com cerca de R$ 13,7 bilhões para investir, segundo levantamento da Spectra feito ao Valor. Uma fonte destacou que empresas com ativos fora do negócio principal estão optando em fazer caixa com a venda de subsidiárias ou negócios.
A questão é que muita empresa postergou a solução para seu balanço e não há sinalização concreta do momento em que os juros começarão a cair. Com isso, a pressão do endividamento aumenta.
Dados do Centro de Estudos do Financiamento das Empresas Brasileiras da Fipe (Cefeb-Fipe) mostram que a alavancagem voltou a subir no último trimestre do ano, para 1,32 vez. O dado exclui os números de Vale, Petrobras e Eletrobras. No terceiro trimestre, esse indicador estava em 1,21 vez, considerando a métrica dívida bruta pelo patrimônio líquido. Segundo o levantamento, trata-se do maior nível desde o início da série histórica, em 2011. Para se ter uma ideia, entre outubro e dezembro de 2015 esse indicador estava em 1,20 vez. O dado considera dívida bruta sobre patrimônio líquido.
Dentre as grandes, Minerva é um dos exemplos de empresa que optou recentemente pelo aumento de capital privado como forma de atravessar o atual momento de Selic em alta e que acaba de atingir o maior patamar em 20 anos. Ontem, o Pipeline, site de negócios do Valor, informou que a companhia garantiu R$ 1,72 bilhão. A empresa teve adesão de 85% dos investidores da base e sinalização de 98% desses de interesse em sobras de subscrição nos R$ 285 milhões restantes. Na Raízen, do grupo Cosan, uma das alternativas na mesa também é um aumento de capital ou a venda de ativos para gerar liquidez para o grupo.
Do lado dos “special sits”, a procura das empresas tem sido crescente. O sócio da Cupertino Capital, Roberto Halpern, aponta que tem sido muito procurado para prover soluções de capital, com muitos empresários já sem liquidez para colocar em suas empresas. Uma das formas de atuação da gestora, segundo ele, tem sido a compra de dívidas das empresas junto aos bancos, para depois trocar por ações (equity) ou estruturar um destravamento de valor em um momento de liquidez da empresa. Ou seja, a gestora é remunerada, por exemplo, quando a companhia vende um ativo.
Segundo o sócio da Spectra, Renato Abissamra, a indústria de “special sits” vem se expandindo no Brasil em um momento em que mais empresas precisam de soluções de capital. “Essa indústria está se desenvolvendo, com teses mais criativas”, comenta. Um reflexo, segundo ele, tem sido casas cada vez mais especializadas e atuando em diferentes nichos.
O sócio da Íntegra Associados, Luis Caldas, afirma que as empresas mais alavancadas têm uma limitação de opção para ajustar o balanço. Segundo ele, mesmo em aportes de “special sits”, devido à necessidade de uma estruturação por meio de garantias, muitas empresas acabam não conseguindo ter acesso a esse capital.
Procurada, a Unigel esclarece que, no curso normal do negócio, efetua negociações regulares com seus fornecedores e credores, buscando a equalização de seu fluxo de caixa e a readequação da sua estrutura de capital. “Tais negociações ocorrem no contexto operacional e trata-se de prática regular do dia a dia da companhia”, acrescentando que “segue cumprindo suas obrigações suportadas pelo seu fluxo de caixa operacional.”
A petroquímica informou que também prospecta, regularmente, linhas de financiamento, seja para um projeto como a planta de ácido sulfúrico, seja objetivando a redução do custo de capital, substituindo dívidas eventualmente mais caras, “especialmente à luz da dinâmica desafiadora do setor atualmente”. “A Unigel informa que não há nenhuma negociação fora do curso normal dos negócios em andamento, e qualquer referência, que não seja com base nos esclarecimentos citados pela companhia, são meras especulações e não refletem a realidade.”
Em nota, a Azul reiterou o comunicado enviado ao mercado na quarta-feira (28), data de entrada do pedido de recuperação judicial nos EUA. No documento, informou que o acordo incluiu os seus principais parceiros financeiros (bondholders, arrendador de aeronaves, a AerCap, e investidores estratégicos United Airlines e American Airlines), para efetivar um processo proativo de reorganização financeira. Para isso, há um compromisso de US$ 1,6 bilhão em financiamento ao longo do processo e a eliminação de US$ 2 bilhões de dívida. “O caso da Azul é diferente de qualquer outra reestruturação de companhias aéreas da região (da América Latina), uma vez que a companhia já entrou no processo com acordos com muitos de seus principais parceiros.”
Já a Raízen venderá ativos não estratégicos e segue em reestruturação, conforme entrevista do fundador do grupo Cosan, Rubens Ometto ao Valor na sexta-feira (30). Casas Bahia e Minerva não comentaram o assunto.
Já a Infracommerce destacou, em nota, que seus resultados financeiros do primeiro trimestre “refletem positivamente o conjunto de medidas estratégicas implementadas pela companhia desde seu plano de reestruturação”. “A empresa está caminhando para o fim do segundo trimestre de 2025 com sinais concretos de transformação. Em apenas seis meses, estabilizou o negócio no Brasil, retomou o crescimento e reduziu as despesas em 30%”, segundo a nota. “Esses avanços reforçam a solidez operacional e abrem caminho para um novo ciclo de expansão”.

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